quarta-feira, 24 de outubro de 2012

O ISS de Obra

Em “Conversa de Fiscais”

- Que processo é este que você está vendo?
- Veio do Urbanismo, para calcular o ISS de uma obra...
- Obra acabada?
- Acabada. O titular está requerendo o habite-se.
- Me deixa ver... Construção de uma casa... Qual foi a empreiteira que construiu?
- Não tem empreiteira, o dono do terreno construiu com o seu pessoal.
- Como assim?
- Ele contratou o pessoal... Está tudo aqui... Olha a relação: um mestre de obras, dois pedreiros, um carpinteiro, um eletricista, um pintor, três serventes...
- Ele assinou a carteira de trabalho da turma?
- Não. Ele só contratou de boca.
- O que é comum... Esse pessoal está inscrito como autônomo?
- Não. Por isso, ele recolheu o ISS do pessoal todo mês durante a obra. Olha aqui... Ele anexou os comprovantes...
- E o Engenheiro responsável?
- Está aqui o nome dele... Está inscrito como autônomo...
- Teve alguma subempreitada?
- Acho que não... Ele juntou as notas de materiais... Cimento, pedra, vidro, mármore, piso, telha, parece que está tudo aqui... O homem é organizado.
- Então devolve o processo! O sujeito está querendo o habite-se!
- Mas, eu não tenho que fazer o cálculo do custo da obra?
- Pra quê?
- Ora, para calcular o ISS da obra!
- ISS da obra? Que ISS é esse?
- Ih mulher! Admiro a sua pergunta! O ISS da obra, uai!
- Cara! Obra não tem ISS! Quem paga ISS é o prestador do serviço, o empreiteiro, o administrador da obra, o subempreiteiro... Você me disse que o próprio dono administrou a obra, que a mão-de-obra pagou o ISS, que não houve subempreitada... O que você quer mais? Você acha que o dono da obra prestou serviço pra ele mesmo?
- Você está me confundindo! Sempre calculei o ISS da obra... Pelo custo da obra!
- Você estima o custo da obra só pra ver se o pessoal contratado e declarado é razoável em razão do tamanho da construção. Você pode até usar a tabela do SINDUSCON, que separa o custo da mão-de-obra e dos materiais aplicados.
- Não é então para calcular o ISS total da obra?
- Seria uma estimativa se houvesse empreitada e o empreiteiro não tivesse pagado nada! Ou quando o recolhimento foi muito baixo! Aí sim! Este cálculo serviria para arbitrar o valor do imposto.
- Mas não houve empreitada...
- É isso que estou dizendo. O sujeito já pagou o ISS da mão-de-obra, não teve empreiteiro, não teve subempreiteiro. A construção foi de 160 m² e a mão-de-obra declarada foi bem razoável em relação à metragem, não foi?
- Bem, não entendo de obra, mas parece que foi...
- Tudo certo, então! Libera o processo!
- Então não cobro o ISS do habite-se?
- Pelo amor de Deus! Habite-se não é fato gerador do ISS!
- Huuum, não sei não... Então você despacha o processo...
- Me dá aqui seu covarde! Eu despacho! O sujeito trabalha direitinho, cumpre todas as regras e ainda vai ficar à mercê dessa burocracia idiota? Nós temos que pegar os grandes sonegadores, isso sim!!
- Ah, isso é difícil...
- Pois é! E aí ficamos azucrinando a vida das pessoas direitas! Lembre-se: Ao povo tudo! Aos sonegadores as penas da lei!!
- Puxa! Parece Joaquim Barbosa...  

Um comentário:

  1. Conversa esclarecedora! E você sintetizou bem quando citou: " azucrinando a vida das pessoas direitas!" Pois é assim que nos sentimos ao buscar orientação em órgãos públicos. Moro na Z. Oeste do Rio, onde grande parte dos loteamentos não são regularizados ou simplesmente não existe, o que não impede sua comercialização e nem que o cidadão exerça seu direito de habitação. No entanto, quando se tenta pedir qualquer licença para obra num local como esse, a resposta é: " Você não pode construir nada nesse local". Ora, e ninguém viu que já está tudo edificado? E as famosas favelas cariocas? Que recebem até incentivos como obras de "maquiagem" e custosos teleféricos?
    Enfim, os municípios não tem competência para controlar e fiscalizar o crescimento das cidades, muito menos acompanhar a celeridade com que isso acontece.
    Vou construir em breve e sua postagem me ajudou bastante.

    Obrigado,
    Rodrigo Iório.

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