quinta-feira, 28 de agosto de 2014

O Cardápio do Contador

Da série: Manicômio Fiscal

- Boa noite! Seja bem-vindo ao Restaurante do Contador!
- Boa noite! Eu tenho boas referências do seu restaurante.
- Ah, graças a Deus temos sido recompensados pela qualidade dos nossos serviços. O senhor tem alguma preferência? Temos vários pratos especiais: sociedade simples, sociedade anônima, sociedade profissional... Temos uma sociedade limitada, huum, de sabor excepcional!
- Bem, na verdade eu estou em dúvida... O Simples Nacional da casa é caprichado?
- O nosso Simples Nacional é inigualável! Vem recheado com purê de sped-fiscal, suavemente condimentado em dívida ativa, notas fiscais eletrônicas à dorê e generosas doses de prescrição.
- Não gosto muito de nota fiscal eletrônica... Se eu não gostar poderei cancelá-la?
- Imediatamente! Basta chamar o garçom!
- E o Simples Nacional vem acompanhado de alvará?
- Sim! O nosso rocambole de licenças traz Alvará da Prefeitura, Alvará do Bombeiro, Alvará da Vigilância Sanitária, Alvará do Meio Ambiente, Alvará dos Alvarás, todos confeitados em papel couchê.
- Puxa, deve ser uma delícia... Este prato é muito caro?
- Bem, o senhor deve entender que este prato é especial, mas temos o Simples Nacional Executivo, o MEI, muito gostoso, porém, não vem acompanhado do antepasto de alvarás.
- Bem, posso examinar o cardápio?
- Perfeitamente! Aqui está o cardápio.
- Este prato aqui, sociedade profissional vem acompanhado de quê?
- Vem com registro no cartório, ISS fixo, pitadas de previdência social, mousse de imposto de renda, CSLL ao ponto, um excelente prato!
- Posso misturar sociedade profissional com simples nacional?
- Claro que sim! Levamos tudo junto ao forno em fogo brando, acompanhado de quiche de anexo IV e gelatina colorida. Fica muito bom!
- E leva também CSLL?
- Leva, mas com moderação! Acrescentar muito CSLL pode salgar o prato.
- O senhor tem razão, aliás, eu tenho alergia ao CSLL.
- A maioria tem! Por isso, a dosagem é bem pequena, não chega a dar enxaqueca.
- E a sociedade limitada?
- Um ótimo prato, mas gostamos de seguir a receita tradicional: pouco capital, pró-labore sem exagero, boa dosagem em lucros acumulados... E também pode ser misturado com o simples nacional.
- E este prato dá para quantas pessoas?
- Dá para duas ou mais pessoas, dependendo, ah-ah, da fome de cada uma.
- Eu estou sozinho, é muita coisa para mim...
- Então, o senhor pode pedir o Eireli Premium, um delicioso prato dietético, servido para uma única pessoa.
- Certo. Mas, eu vou pedir uma sociedade limitada acompanhada de simples nacional.
- Ótima pedida! E como sobremesa?
- Qual é a sua sugestão?
- Bem, temos ótimas tortas de isenções municipais, taças de incentivos fiscais e um delicioso pudim de elisão fiscal.
- Eu gosto muito é de uma imunidade flambada...

- Ahh! O senhor tem bom gosto! Quer ver a nossa Carta de Imunidades?

sábado, 23 de agosto de 2014

O Pesadelo

Eu dormia profundamente na total escuridão, até mesmo sem motivos para sonhar, quando de forma repentina, como um clarão resplandecente, um vulto iluminado surgiu das trevas inexpugnáveis, aproximou-se e disse essas palavras:

Faça dessas regras sua estrita observância:
O controle das nações será assegurado pela criação de gigantescos monopólios privados que serão os depositários de riquezas das quais todos dependerão.
Crises econômicas atingirão ciclicamente as nações, subtraindo-lhes o dinheiro colocado em circulação. As riquezas serão por nós acumulada e dosaremos empréstimos aos Estados, de tal modo que eles se tornarão nossos cativos.
As dívidas dos governos tornarão os seus gestores corruptíveis, o que os deixará cada vez mais à nossa mercê.
Nós apoiaremos a todos, não importa a ideologia, e, particularmente, os operários.  Ganharemos sua confiança e eles se tornarão assim, para nós, um instrumento muito útil.
Supriremos dos homens sua verdadeira fé.  Modificaremos ou eliminaremos os princípios das leis espirituais. A ausência dessas leis enfraquecerá a fé dos homens, pois as religiões não serão mais capazes de dar nenhuma explicação.
Preencheremos essas lacunas introduzindo um pensamento materialista dirigido aos interesses exclusivamente individuais.
Para ter domínio sobre a opinião pública, leva ao povo a ignorância que sempre o confundirá.
A imprensa nos será uma boa ferramenta para oferecer aos homens tantas opiniões diferentes que eles perderão qualquer visão global e se perderão no labirinto das informações. E o povo chegará ao ponto de não ter nenhuma opinião.
O povo perderá, cada vez mais, o hábito de pensar por si mesmo e de formar o seu próprio pensamento. Ele acabará pronunciando as palavras que desejarmos ouvir pronunciadas.
Suscitaremos nas pessoas uma sede de luxo, a busca do impossível. Deste modo, fomentaremos os vícios, a corrupção e o roubo.
Elas estarão presas na armadilha do sistema antes de poder identificá-lo.
Destilando um sopro de liberalismo nos órgãos de Estado, nós modificaremos todo seu aspecto político.
As eleições serão, para nós, um meio de chegar ao trono do mundo, sempre fazendo crer ao modesto cidadão que ele contribui para melhorar o Estado com a sua participação.
Ao mesmo tempo, reduziremos a nada o impacto da família e seu poder educativo. E dedicaremos todos os nossos esforços para impedir o surgimento de personalidades independentes.
Nosso sucesso, no tratamento com os homens dos quais necessitamos, será facilitado por nosso modo de tocar sempre o lado mais sensível da natureza humana, isto é, a cupidez, a paixão e a sede insaciável de bens físicos e materiais.
Nosso poder reside também na penúria permanente da alimentação. Agiremos sobre as massas pela carência, e aproveitaremos a inveja e o ódio que disso resulta.

E antes de evaporar-se no espaço, o ser iluminado sussurrou:

“Diga apenas aquilo que os poderosos querem que tu saibas”.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Sociedades Profissionais: o custo tributário no Simples Nacional

A nova Lei Complementar 147, de 7 de agosto de 2014, permite o ingresso de Sociedades Profissionais e sociedades simples de natureza intelectual no Simples Nacional. Assim, sociedades de advocacia, de medicina, de engenharia, além de corretoras de seguro, representações comerciais e tantas outras poderão entrar no Programa do Simples Nacional.

A pergunta, porém, é a seguinte: será que vale a pena em termos de encargos tributários? Vamos comparar ao sistema do Lucro Presumido:

Advocacia –
Sociedades com faturamento mensal de R$250 mil (ou anual de R$3 milhões):
Conforme Anexo IV da LC 123/06 (Simples Nacional):
IR – 5,21%
CSLL – 2,27%
COFINS – 2,51%
PIS/PASEP – 0,51%
ISS – 5%
Total: 15,50%
 (O INSS será recolhido de acordo com o valor da folha de pagamento do Pessoal)

Lucro Presumido, tendo por base o mesmo faturamento acima:
IRPJ – 4,88%
Adicional do IRPJ – 2,40%
CSLL – 2,88%
COFINS – 3,0%
PIS – 0,65%
ISS – Valor fixo instituído pelo Município.
Percentual total (sem o ISS): 13,73%
(O INSS será recolhido de acordo com o valor da folha de pagamento do Pessoal).

Nos casos de sociedades de médicos (ou de engenheiros, dentistas etc.) que, ao contrário das sociedades advocatícias, foram alocadas no Anexo VI, o custo tributário, nas mesmas condições do exemplo dos advogados, será de 17,32% de tributos federais, mais 5% de ISS, dando um total de 22,32%, porém, já com o INSS embutido. No Lucro Presumido o percentual seria o mesmo dos advogados, de 13,73% sem o ISS.

Há, portanto, uma diferença a favor do Lucro Presumido, muito em função do ISS. Vamos supor que o Município estabeleça R$500,00/ano por profissional, e a Sociedade tenha dez profissionais. Neste caso, o custo do ISS/ano seria de R$5.000,00, valor substancialmente menor que 5% de R$3 milhões (R$150 mil).

A questão toda gira em torno do conceito de Sociedade Profissional, que não pode ter natureza de empresa. Assim, se uma sociedade de profissionais fizer opção pelo enquadramento no Simples Nacional estará aceitando o fato de ser uma sociedade empresarial, a lembrar que o programa aglutina micro e pequenas empresas, consoante os termos do art. 966 do Código Civil (definido no art. 3º da LC 123/06).

E sendo assim, os Municípios certamente não estenderão o benefício do ISS fixo a favor das sociedades empresariais optantes do Simples Nacional. Em termos aparentes, o enquadramento no Simples Nacional seria vantajoso somente para sociedades de advogados com receita bruta anual de até R$2 milhões, pois estas sociedades estão incluídas no Anexo IV. Para as demais categorias, que se enquadram no Anexo VI, mesmo a considerar o INSS embutido neste Anexo, não se vê vantagem em nenhuma faixa.

(Os cálculos acima foram elaborados com a colaboração de Sidnei Dieckow Lima, da Essencial Assessoria). 

sábado, 9 de agosto de 2014

O IPTU DO MICROEMPREENDEDOR

Da série: Manicômio Fiscal

O cidadão entra no setor de Plantão Fiscal da Prefeitura e se dirige ao servidor.

- Bom dia, o senhor é Fiscal?
- Sou, o que o senhor deseja?
- É o seguinte: moro em casa própria e pago ptiú como proprietário, mas agora eu sou MEI, conserto carro. O meu ptiú vai mudar?
- O senhor vai consertar carros na sua própria casa?
- Vou. Já tirei até o alvará. Eu tenho um quintal bom pra trabalhar.
- O senhor tirou o alvará aqui na Prefeitura?
- Bem, na verdade não sei. O despachante fez tudo pra mim.
- O senhor pode me mostrar o alvará:
O cidadão tirou um papel da pasta.
- Está aqui.
- Mas este papel não é da Prefeitura.
- Não é não?
- Não! É de uma tal Associação Protetora de MEI – APROMEI. Nunca ouvi falar nessa Associação.
- Mas está tudo certo! Paguei até as taxas.
- Que taxas?
- Um monte de taxas... Taxa de Alvará, Taxa de Licença, Taxa de Bombeiro...
- Foi pedido licença ao Bombeiro?
- Bem, eu só paguei. O despachante fez tudo.
- Meu senhor, isso aqui não serve. O senhor tem que tirar o alvará na Prefeitura.
- Não! Desculpe, mas o senhor está enganado. A Prefeitura não manda nada nesse negócio de MEI. É tudo com o governo federal, SEBRAI, APROMEI...
- Acho que o senhor é que está enganado. O alvará ainda é da competência do Município.
- Bem, não vamos ficar aqui discutindo, já vi que o senhor está desatualizado. O que eu quero mesmo saber é como fica o meu ptiú.
- Por enquanto tudo igual. O imóvel continua de uso residencial para a Prefeitura.
- Mas, se a fiscalização me pegar trabalhando lá?
- Nós vamos interditar por falta de alvará.
- Mas eu tenho alvará! Está aqui!
- Este alvará não serve! Tem que ser da Prefeitura!
- Mas a Prefeitura não manda mais nada!
- Já disse que o senhor está enganado! Se a gente pegar o senhor transformando a sua casa em oficina, nós vamos interditar!
- Puxa! O senhor está nervoso.
- O senhor não quer entender!
- Vamos deixar isso de lado. Eu queria pedir um favor ao senhor.
- Que favor?
- Quero mudar o meu nome no ptiú para Oficina Mecânica do Randolfo. Randolfo é o meu nome.
- O senhor fez alteração na escritura do imóvel?
- Não! Não precisa mais. Agora eu sou MEI!
- É claro que precisa!
- Bom, já vi que o senhor está totalmente por fora. Deixa pra lá. Eu vou procurar a APROMEI para mudar o meu ptiú. Pago uma taxa e APROMEI resolve.