sábado, 25 de julho de 2015

Quem paga o ISS de obras


Em muitos Municípios a lei local designa o contratante de serviços de construção civil como solidário ao pagamento do Imposto sobre Serviços – ISS, relativo ao serviço prestado pelo empreiteiro ou pela mão de obra contratada. Assim, se você contratar empreiteira ou mão de obra para construir a sua casa, prepare-se para uma possível cobrança do imposto a bater em suas costas. O curioso é que você não presta serviço nenhum, pelo contrário, você contrata serviço de terceiro, mas o fisco poderá cobrar de você.

Mais curioso ainda é a confusão da lei, a misturar alhos com bugalhos. Solidário na obrigação só pode ser quem estiver no mesmo polo da relação negocial com o contribuinte, isto é, o solidário participa ao lado do contribuinte no fato gerador do tributo. Por exemplo, quando duas pessoas prestam serviço para um mesmo tomador e no mesmo negócio. Tomador de um lado e dois prestadores do outro lado. Esses prestadores podem ser, se a lei determinar expressamente, solidários na obrigação total. Neste caso, o fisco pode cobrar o valor total de um deles, sem preferência de ordem. Se um pagar, dispensa-se o outro.

Da mesma forma no IPTU: se o imóvel tiver dois proprietários, o imposto poderá ser cobrado somente de um deles, daquele que for mais fácil efetuar a cobrança. Isso, se a lei nomear a solidariedade em tais casos. O mesmo se dá entre proprietário e promitente comprador. O IPTU poderá ser cobrado de um ou de outro, a critério do fisco municipal.

Pois bem, está claro que tomador do serviço não é, de forma alguma, solidário ao prestador, pois o tomador está no polo oposto do negócio. Poderia ser, isso sim, um mero responsável pela retenção do ISS na fonte pagadora. Quando efetua o pagamento do serviço, obriga-se a reter o imposto e fazer o seu recolhimento aos cofres públicos. Também quando a lei assim determinar. Mas, não vamos confundir solidariedade (alhos) com responsabilidade pela retenção na fonte (bugalhos). São institutos bem diferentes.

O problema maior está, portanto, com o tomador ou adquirente do serviço. Batizado de solidário, se ele bobear vai acabar pagando o imposto que o prestador deveria pagar. E em muitos casos, o coitado nada sabe a respeito de tais complicações tributárias. Afinal, ele queria apenas ver a sua casa construída, mas quando for resolver a papelada se vê num verdadeiro inferno de Dante, abandonado nas profundezas da sanha arrecadatória. Rezemos por sua alma!

E pensa que é só isso? Não! Vem agora a análise da base de cálculo do ISS, tarefa exercida por magos holísticos da administração fazendária. Calcula-se o tamanho da obra, multiplica-se o metro quadrado pelo total, pesquisa-se um fator relativo ao padrão da obra, adicionam-se os adicionais, somam-se os insumos, diminuem os materiais incorporados na obra, uma matemática louca, digna de Joaquim Levy!

E naquele emaranhado de números, chega-se a um resultado. A vítima tem que pagar ou recorrer. Se recorrer, não recebe a liberação do imóvel enquanto o processo não transitar em julgado, mas, na área administrativa ele sempre perde. Entrar na justiça é mais despesa, advogado e etc. (e esse etc. às vezes é muito pesado). Acaba pagando. Contudo, lá no fundo da sua alma, fica a impressão de que foi ludibriado.

E foi mesmo! 

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Truculências e arbitrariedades tributárias

Um Município do Estado do Rio de Janeiro resolveu fazer convênio com o Governo estadual para ajudar a apreensão de veículos que circulam sem o IPVA quitado. Pura truculência! Diz a Constituição (Artigo 5º, LIV): “Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. A dizer que a mera existência de débito, ainda não ajuizado e que ainda não ofereceu ao suposto devedor o direito de defesa, não pode ser motivo de o Estado apropriar-se do bem, nem mesmo apreendê-lo para forçar o pagamento do tributo.

A Justiça já sentenciou: “A sanção administrativa somente poderia ter sido aplicada após o transcurso do regular processo administrativo, no qual o impetrante poderá exercer o seu direito de defesa, com a observância do devido processo legal, a teor do art. 5º, incisos LIV e LV da Constituição Federal” (Tribunal Regional Federal). Sem o devido processo legal transitado em definitivo, incabível ações de tamanha arbitrariedade.

Débito tributário é resolvido na Justiça! Cabe à Justiça, e a nenhuma outra instituição pública, autorizar a execução da dívida, arresto ou penhora de bens. Para isso temos juízes, promotores e advogados.
Todavia, as autoridades públicas do poder executivo são dotadas de uma extraordinária capacidade criativa quando se trata de pressionar os inadimplentes ao pagamento de suas dívidas. Exemplos:

No Estado do Rio de Janeiro (o mesmo ocorre em alguns outros Estados), os proprietários de veículos a motor são obrigados a passar seus carros por uma vistoria anual. O motivo é dignificante: verificar se os veículos estão em condições perfeitas para uso em trânsito. O curioso, porém, é que basta andar nas ruas e constatarmos o número de carros caindo aos pedaços a circularem tranquilamente. Por quê? Porque as blitz de rua servem apenas para examinar o bafo do motorista ou a mercadoria que transporta. E, evidente, verificar se o IPVA foi pago. Na verdade, a tal vistoria tem por objetivo único obrigar o proprietário a manter quitado o imposto, pois a vistoria não é feita se o tributo não tiver em dia. Desta forma, não se apreende o veículo por causa do imposto, mas, porque o veículo não foi vistoriado.

O mesmo ocorre nas Prefeituras com a tal renovação do alvará de funcionamento. Exige-se a renovação do alvará todos os anos, mas, o motivo verdadeiro é obrigar o comerciante a manter em dia a taxa anual de fiscalização. Não se renova o alvará com a taxa não quitada, e, assim, o estabelecimento poderá ser interditado porque o alvará não foi renovado. Que sutileza, não é mesmo?

Outro exemplo é a liberação do ‘habite-se’ de edificações concluídas. O documento somente é expedido se o ISS dos serviços prestados na obra estiver devidamente quitado. Não vem ao caso a conclusão definitiva da obra, já em condições de habitabilidade. O que interessa é o pagamento do imposto. E assim, o titular não pode permitir o uso do imóvel enquanto não quitar o que foi determinado pelo Fisco.

E, pasmem, já ouvi de um criativo servidor público a ideia de criar a exigência de vistoria anual de residências (casas ou apartamentos). Todos os anos o ocupante do imóvel terá de submetê-lo à vistoria. E, em meio aos documentos, apresentar o IPTU devidamente em dia. Se o imóvel não for vistoriado, uma pesada multa será lavrada. Mais sutil que uma manada de elefantes em debandada. 

quarta-feira, 15 de julho de 2015

A operação Lava a Jato na Comunidade


Extremamente aporrinhado com a derrota do Botafogo no jogo contra o Figueirense, fui de manhã comprar o pão e nem parei na banca de jornais do Daniel. A turma estava lá, em discussão acalorada; fingi que não vi e passei direto. Aconteceu o que eu temia: “Doutor!” “Doutor!”, Chinelinho me chamava. Fingi que não ouvi. “Grita mais alto, ele é surdo”, ouvi Henheco dizer ao Chinelinho. Este, com aquela sua voz estridente, deu um grito, chamando-me. Não tive alternativa, fui até lá.

A dona BPereira foi logo falando: “Doutor, tira a nossa dúvida: esse tal de Collor, que a polícia pegou os carros dele, já não esteve preso anos atrás?”. Respondi firme: “Não! Ele nunca foi preso!”. Henheco sorriu triunfante: “Eu não disse! Ele é um velho conhecido ladrão de carro, mas nunca tinha sido preso!”. Reagi: “Collor ladrão de carro! Essa eu não sabia!”.

Chinelinho estranhou: “Ora, doutor, o senhor não lê jornal? A polícia invadiu a casa dele e pegou um monte de carro roubado”. E o seu Broa, com a sua fala mansa: “E só carrão importado”. Henheco fez a sua intervenção: “Se me lembro bem, antigamente ele roubava Elba. O negócio deve estar melhorando”.

Daniel ponderou: “o que não entendo, doutor, é essa operação Lava a Jato se meter com ladrão de carro. Ela não é para pegar roubalheira na Petrobrás?”.

Índio das Verduras, que até agora estava quieto, a comer uma banana, resolveu participar da discussão: “É por causa do desvio de gasolina, Daniel! O escândalo já chegou aos postos de combustível!”. Dona BPereira concordou: “Por isso que se chama lava a jato. Posto de gasolina tem lava a jato”.

Henheco, o extremista, vociferou: “Duvido que a polícia prenda os donos das fábricas de carro. Só vai ficar nos intermediários”. Eu já estava irritado: “Gente! Vamos resumir: Collor não é ladrão de carro! Nunca foi preso! Ele foi é cassado da presidência!”. O seu Broa deu um sorriso: “Que é isso, doutor. Quem foi presidente foi um tal de PC Faria, que o Lula mandou matar”.

Desisti. Fui à procura do meu pão e deixei os “sans culottes” da comunidade em plena discussão. Aliás, eu ali já fazia o papel de um girondino e estava prestes a ser decapitado na guilhotina. De qualquer modo, refleti: “É assim que nasce uma revolução popular. Vamos deixá-los discutir à vontade”. 

domingo, 12 de julho de 2015

Cachaças Maravilhosas

No dia 22 de fevereiro de 2015 postei o artigo “Cachaças Verdadeiras”, onde citei sete exemplos de cachaças maravilhosas.


Pois agora acrescento mais três top de linha:

Eis aí o meu amigo Angelo Mocelim, de Ponta Grossa, e à sua frente duas honestíssimas cachaças: Vale Verde e Claudionor.
A Vale Verde é mineira e a sua Vale Verde Premium 12 anos é realmente fantástica!
A Claudionor, também mineira, de Januária, tem uma aparência modesta, mas é sensacional.












E olhe eu aí, no alambique da BENTO ALBINO!
Cachaça fabricada em Maquiné, Rio Grande do Sul.
Envelhecida em barril de carvalho e teor alcoólico de 40%. Só conseguiram me tirar de lá à força.
Como dizem os mineiros, NOOOOSSA! Que coisa boa!

Mas, por favor, não misturem cachaça boa com limão (a tal de caipirinha é de matar de ruim!). Não coloquem frutinhas, cascas de madeira e outras maluquices na cachaça boa. Isso é um crime!
E beba cachaça acompanhada de água, para hidratar. 

sábado, 11 de julho de 2015

Os Ministros do Supremo Tribunal Federal

O Supremo Tribunal Federal foi assunto de manchetes de jornais: a nomeação de novo ministro e a aprovação da chamada lei da bengala.

A nomeação do novo ministro foi alvo de protestos por parte da Intelligenza brasileira, ou seja, por uma parcela da elite brasileira, porque o povão não está nem aí para esses assuntos. Alguns senadores fizeram estardalhaço antes do espetáculo, mas, no dia do show, aprovaram o novo ministro.
A lei da bengala postergou a aposentadoria compulsória em cinco anos. Em vez de setenta, os ministros serão aposentados compulsoriamente com setenta e cinco. Não acho que a idade de setenta e cinco já exige o uso da bengala, a não ser em caso de queda e doenças do tipo joelho mole e gota. Como tudo no Brasil é copiado dos Estados Unidos, a idade dos ministros da Suprema Corte Americana é a seguinte:

Ruth Joan Bader Ginsburg – 82 anos;
Anthony Kennedy – 79 anos;
Antonin Scalia – 79 anos;
Stephen Gerald Breyer – 77 anos;
Clarence Thomas – 67 anos;
Samuel Anthony Alito Jr. – 65 anos;
Sonia Maria Sotomayor – 63 anos;
John Glover Roberts, Jr – 60 anos;
Elena Kagan – 55 anos.

A dona Ruth Joan Bader Ginsburg, de 82 anos, não usa bengala, mas, segundo soube, ela gosta de circular nos corredores do palácio montada numa cadeira de rodas elétrica, e já atropelou alguns assessores. Em suas corridas está sempre seguida por um plantão médico para eventuais emergências.

Podem discordar à vontade, mas, em minha opinião, ministro do Supremo Tribunal Federal deveria ter experiência anterior na magistratura, nem que fosse “apenas” como Juiz de Direito. Desta forma, comprovaria que: a) já foi aprovado em concurso público; b) ter experiência em julgar e sentenciar. Essa exigência de “notável saber jurídico e reputação ilibada”, cá entre nós, é uma bobagem. Basta escrever (ou plagiar) uma monografia e o “notável saber jurídico” é reconhecido. E “reputação ilibada”, francamente, quem não a tem? Até eu tenho.

Aliás, dos nove ministros da Suprema Corte Americana, somente um não foi juiz. A ministra Elena Kagan, a mascote da Suprema Corte, é a única que não exerceu a magistratura. Contudo, ocupou o cargo de Reitora da Harvard Law School, uma das mais conceituadas escolas de Direito do mundo. E foi Advogada-Geral dos Estados Unidos. E nunca foi advogada de partido político! Mesmo assim, foi difícil ser aprovada no Senado americano. A propósito, o Senado americano é rígido na aprovação de ministros. Na história, um terço dos indicados foi reprovado.

Também não gosto desse negócio de ministro ser indicado pelo Executivo. Não deixa de ser uma interferência do Governo Federal no Judiciário. Os ministros deveriam ser indicados numa votação entre os desembargadores dos Tribunais de Justiça estaduais e federal, atendendo uma série de requisitos. Entre eles, estabelecer uma proporcionalidade: cada estado selecionaria um candidato e depois haveria uma votação geral entre os escolhidos.

Tudo bem! Pode não dar certo, mas, pergunto, o sistema atual está dando certo?

sexta-feira, 10 de julho de 2015

Crianças e Crionças

Dois jovens de 17 anos estavam à meia-noite na rua, e a nossa eficiente polícia, que prende, julga e executa a sentença, tudo ao mesmo tempo, mandou bala nos adolescentes, ferindo um e assassinando o outro. Nada diferente do que já estamos acostumados.

A mãe de um dos jovens, entretanto, fez uma declaração tanto inusitada: “As crianças estavam brincando na rua e a polícia chegou atirando”. Bem, polícia chegar atirando nada tem de inusitado, mas dois jovens de 17 anos “brincando na rua” é algo, vamos dizer assim, tanto curioso.

A pergunta que faço é a seguinte: adolescente de 17 anos ainda brinca na rua? O verbo brincar significa divertir-se. E jovem de 17 anos também se diverte. Ir a um baile é divertimento; namorar nessa idade não deixa de ser um divertimento; jogar uma pelada também é divertimento. Mas existem divertimentos perfeitamente lícitos e outros totalmente ilícitos e perigosos.

Por isso, vamos dividir os jovens de 17 anos em dois tipos de adolescentes: as crianças e os crionças. As crianças são aquelas ainda meio inocentes, que ficam dando risadinhas por qualquer motivo. Bastam duas crianças juntas e as risadinhas surgem. Aliás, com o tal do aifone, criança não precisa da companhia de outra para dar risadinhas. São risadinhas solitárias, sai andando na rua, olhando o aifone e dando risadinhas.

As crionças não ficam de risadinhas: estão nas ruas a trabalho, e crionça não brinca em serviço. Sua percepção de trabalho é de lesar ou prejudicar alguém para ganhar alguma coisa. Sobrevive com a desgraça alheia. A crionça vive à espreita, de tocaia, à procura do incauto. Assim como o seu similar, o bicho onça, prefere o trabalho noturno, escondido nas sombras da noite, mas, se surge uma oportunidade, ataca também de dia. Sua luta de sobrevivência está à margem da moral, vive num mundo amoral, onde todos os outros, semelhantes ou não, são suas prováveis vítimas e inimigas. O mundo é o seu inimigo.

A criança estuda sob o amparo da família com perspectivas futuras. A crionça não tem perspectivas futuras, vive e se alimenta do momento atual, o seu amanhã é hoje. A criança é meio frágil, adoece, vai ao médico e toma remédio. A crionça não se permite a tais luxos, se ficar doente, morre, e por isso se fortalece no trabalho de enfrentamento. É arisco, sabe atacar, sabe correr, sabe fugir e esconder-se.

O jovem de 17 anos ainda é adolescente, segundo a lei. A crionça de 17 anos não é criança. Há muitos anos não brinca, o seu mundo não é de brincadeira: é um mundo de ódio.